Ouvem-se os ponteiros angulares em linha recta no tempo que passa a correr atrás da vida. Os anos contam-se diante dos olhos um por um, nas marcas que sobressaem na pele e assim descobrimos que o tempo para viver daqui para a frente é como uma luz ao fundo do túnel.
O tempo, nome próprio dos minutos, segundos, horas, dias, meses, anos e séculos que fazem o relógio descontrolar, é como uma tertúlia de rugas descaracterizadas. As minhas mãos padecem desse mal, estão enrugadas e as manchas sardosas teimam em aparecer uma aqui e outra ali.
Mais adiante no espelho uma desconhecida ergue-se perante os meus olhos de cabelo grisalho e com rugas descaídas silenciosamente pelo seu rosto. É engraçado ver aquela senhora é tão parecida comigo! O certo é que quando me mexo ela também o faz, se abro a boca ou levanto um dedo a senhora imita-me como se fosse um Mimo.
Sinto o corpo encurvado com a cabeça quase rende aos tornozelos e quando me tento endireitar a coluna protesta numa dor lancinante. Serei eu que estou ao espelho? Não acredito que seja, ainda ontem era uma jovem que corria e saltava o tempo passara assim tão fugazmente?
O certo é que a vida passou por mim como um relâmpago que rasga o céu. Os meus lábios outrora carnudos que desenhavam um lindo sorriso agora padecem no meu rosto em tom desajeitado e desfalecido. Ordenei ao relógio que parara na minha juventude, mas o desgraçado não me fizera caso!
Olho em volta para a minha casa desarrumada e vejo que mal me posso levantar. “O meu Óscar não tardará a chegar da escola para me ajudar a arrumar esta barafunda” — acordo para a vida de rompante e deparou-me com a casa imergida na penumbra mórbida do silêncio e caiu sobre a minha própria consciência-“ estou sozinha, envelheci sozinha”. As lágrimas curvam-se pelo meu rosto abaixo pela saudade da solidão, o abandono apodera-se de mim e assusta-me ao reaparecer novamente enquanto volto a repetir por entre dentes a palavra“ s-o-z-i-n-h-a”.
Um gato ouve-se a ronronar por entre as pernas das cadeiras e vêm roçar-se pôr as minhas pernas desnudas. “Miau, miau...”, o gato ronceia até saltar para o meu colo onde se acocora numa bola de pêlo. Esta será a minha única companhia, e quando os meus olhos fecharem ninguém sentirá a minha falta e o tempo passa e passa a correr pela vida. O relógio não pára de rodar os ponteiros que se fazem ouvir pela casa, “tique-taque, tique-taque”, e os olhos cansados vão adormecendo na companhia do gato que dorme ronronando de lágrimas pendidas sobre o seu dorso de um rosto de sorriso apagado pelo tempo deambula pelo último “taque” do relógio que falha compassadamente em outro segundo de um coração perdido na saudade de viver. Nestas rugas do meu corpo de lembranças sou órfã dos meus filhos que tanto amei, e quando partir nem se recordaram de mim. Serei somente pó diante dos seus olhos esquecidos.
"É hora de partir meu amado Tareco, fecha os olhos e sonha num sono profundo seremos de novo crianças!"
Cláudia Lopes
Imagem retirada da Internet:
https://www.deviantart.com/qawsedrfqq/art/oldness-201391566
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